Ele dorme ao meu lado. Mesmo assim, sei que estou só. Eu e algo incômodo, que há tempo me perturba, me preocupa, me desconcerta. Mas, não quero pensar nisso agora... Aqui estamos depois de uma transa. Nem dá para acreditar! Foi intenso! Quase perfeito! E isso me assusta. Delícia e culpa. Ele dorme tranquilamente. O quarto de hotel– esconderijo improvisado – está em silêncio.
Lá fora, o barulho do mar.
Acaricio de leve seus braços. Não quero que acorde. Embora eu tenha tanto para falar. Mas, não teria coragem. Não depois desta noite. Quem diria, nós dois? Lembro quando nos conhecemos. Chegou num fim de noite ao meu lado e me pediu um cigarro. O dia tinha sido difícil. Trocamos algumas palavras, alguns sorrisos e olhares. Que jeito de falar! Logo pensei cá comigo: - uma voz dessas no meu ouvido faria um estrago. E não me enganei.
Dias depois ele voltou. E na outra noite, mais outra. Falamos da vida, ideais, planos, família... E trocávamos e-mails. Telefonava. Depois sumia por vários dias... E eu continuava lá, esperando.
Agora, aqui estamos neste quarto. Preciso de um cigarro. Ou preciso falar. Que mania que tenho de falar, falar, falar quando algo não vai bem.
Deve ser para chamar a atenção. Sou dessas pessoas fáceis de serem esquecidas... E ele tão importante! Tem tanta coisa que eu queria falar para ele. Da minha vida. Dos livros que estou lendo. Daquela poesia que queria ter escrito. Da minha infância. Do meu cachorro. Dos meus enganos. Das minhas inquietudes. E agora tem essa coisa que começou a doer dentro de mim. E eu não sei o que é.
Estranha essa mistura de prazer e dor.
Melhor não. Seria mais fácil acreditar que foi só uma aventura? Bem que eu gostaria de ser menos complicada. Ser feliz, sem pensar, somente sentir. Mas não dá. Não é bem assim. Não com nós dois. Cada um tem sua vida lá fora. Somos diferentes.
Ele vira de lado e segue dormindo. Ele não me conhece por inteira, mesmo que tenha transado comigo. Nem percebeu meu coração, ou talvez tenha e eu não consegui perceber. Ele é tão difícil de decifrar.
Já não consigo ficar deitada. Que dor estranha é essa, aqui dentro? Quem sabe o que isso quer dizer. Melhor ir.
Silenciosamente, visto minhas roupas. Com o sapato e o coração nas mãos, olho para ele mais uma vez. Apago a luz. Devagar fecho a porta e saio para a rua. Logo vai amanhecer. As ondas vão e vêm. E essa dor que não se acalma!
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